sexta-feira, 30 de março de 2012

Mudança da Lei Seca enfraquecida após a decisão do Superior Tribunal de Justiça?

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu na quarta-feira que apenas o bafômetro e o exame de sangue servem como prova da embriaguez de um motorista e podem ser levados em consideração em processos criminais.

A Justiça não aceitará mais como provas o depoimento de testemunhas ou o exame clínico, no qual a presença de álcool é atestada a partir de sinais exteriores, como desequilíbrio ou odor. A mudança enfraquece a chamada Lei Seca.

A partir de agora, o motorista que se recusar a fazer o teste do bafômetro ou de sangue, o que é um direito de todo cidadão, não poderá ser acusado ou punido pelo crime de dirigir embriagado, mesmo que haja sinais evidentes de que está embriagado.

A lei determina que é crime dirigir com uma quantidade de álcool acima de seis decigramas por litro de sangue. Abaixo, tire suas dúvidas sobre a decisão:

O que deixa de valer
Ônus da prova
— Quando o motorista se nega a fazer o teste do bafômetro, ele pode ser considerado embriagado pela autoridade de trânsito, pela inversão do ônus da prova. Para fins criminais, no entanto, isso não terá validade.

Exame clínico
— O agente leva o motorista até um médico, que preenche um laudo onde são assinalados pontos como existência de odor de álcool, vestes desalinhadas, equilíbrio, exaltação, olhos vermelhos e agressividade. Essa avaliação deixa de ter valor para a Justiça.

O que continua valendo
Teste do bafômetro
O bafômetro indica o número de miligramas de álcool por litro de ar expelido dos pulmões, demonstrando se o motorista está dentro do permitido por lei. Pode ser feito no momento da abordagem.

Exame de sangue
Verifica a quantidade de álcool no sangue e se o motorista consumiu além do permitido. É feito no Departamento Médico Legal.

As mudanças
O que diz a legislação?
É crime, com pena de seis meses a um ano, dirigir com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a seis decigramas.

O que o STJ decidiu?
Para fins criminais, só o bafômetro e o exame de sangue são válidos como prova. Testemunhos e sinais exteriores não têm validade judicial.

A Lei Seca fica esvaziada?
Ninguém é obrigado a produzir provas contra si e, por isso, o motorista não precisará fazer o teste do bafômetro ou exame de sangue, o que inviabiliza a comprovação da embriaguez para efeitos penais.

A decisão muda as blitze da Balada Segura?
Não. Na blitz, o motorista poderá sofrer penas administrativas. Na área administrativa, que envolve as multas, continua valendo como evidência a observação da autoridade de trânsito.

O que muda na área criminal?
Caso o MP processe o motorista por embriaguez, o processo deverá ser trancado quando chegar ao STJ, que não vai aceitar outras provas.
 
Correio do Contestado

Dúvidas sobre a decisão do STJ

1 - O que o STJ decidiu?
Apenas bafômetro e exame de sangue podem provar a embriaguez no caso de processo criminal
2 - A decisão muda a blitz da lei seca?
Não. Na blitz, o motorista não é obrigado a fazer o bafômetro ou exame de sangue, mas ainda pode sofrer penas administrativas (como multa e retenção da carteira) com base em provas testemunhais e exames clínicos
3 - O motorista ainda pode ser detido caso se recuse a soprar o bafômetro?
Segundo a polícia, sim, caso o delegado constate a embriaguez pela própria observação e relatos de testemunhas ou pelo exame clínico no IML (Instituto Médico Legal)
4 - Como ficam os indiciamentos?
A Polícia Civil diz que seguirá a lei de trânsito e vai indiciar (abrir investigação formal) motoristas bêbados que se envolvam em crimes mesmo que não se submetam ao bafômetro
5 - Como a decisão afetará, na prática, os processos criminais?
Caso o Ministério Público denuncie o motorista por embriaguez sem exame de sangue ou bafômetro e a Justiça estadual condene, o processo deverá ser trancado quando chegar ao STJ, que não aceitará essas provas

quinta-feira, 29 de março de 2012

Cai número de leitores no país e metade não lê

A terceira edição da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, a ser apresentada hoje na Câmara, revelou que a população leitora diminuiu no País. Enquanto em 2007 55% dos brasileiros se diziam leitores, hoje esse porcentual caiu para 50%.

São considerados leitores aqueles que leram pelo menos um livro nos três meses anteriores à pesquisa. Diminuiu também, de 4,7 para 4, o número de livros lidos por ano. Entraram nessa estatística os livros iniciados, mas não acabados. Na conta final, o brasileiro leu 2,1 livros inteiros e desistiu da leitura de 2.

A pesquisa foi feita pelo Ibope Inteligência por encomenda do Instituto Pró-Livro (IPL), entidade criada em 2006 por Câmara Brasileira do Livro (CBL), Sindicato Nacional de Editores e Associação Brasileira de Editores de Livros Escolares. "É no mínimo triste a gente não poder comemorar um crescimento", disse Karine Pansa, que acumula a direção do IPL e da CBL.

Participaram da apresentação representantes de entidades livreiras e do poder público, entre eles a ministra da Cultura, Ana de Hollanda. Ela destacou a importância do estudo para o direcionamento das políticas públicas do Minc e do Ministério da Educação. "Temos de ter um olhar da cultura que vai além do ensino e que abra os olhos para outras dimensões. O livro é que vai permitir a formação da cidadania", disse a ministra.

O levantamento foi realizado entre junho e julho de 2011, com 5.012 pessoas de 5 anos ou mais, em suas próprias casas. Todas as regiões do País foram incluídas e a margem de erro é de 1,4%.

Questões diversas
Para compor o mapa da leitura, questões diversas foram analisadas. Os principais motivos que mantêm leitores longe de livros são falta de tempo (53%) e desinteresse (30%). O livro digital, novidade deste ano, já é de conhecimento de 30% dos brasileiros e 18% deles já os usaram. A metade disse que voltaria a ler nesse formato.

A mãe não é mais a maior incentivadora da leitura, como aparecia na pesquisa passada. Para 45% dos entrevistados, o lugar é ocupado agora pelo professor. A biblioteca, tida como espaço para pesquisa e estudo, é o lugar escolhido para a leitura de um livro por apenas 12% dos brasileiros - 93% dos que leem o fazem em casa. Ter mais opções de livros novos foi apontado por 20% dos entrevistados como motivo para frequentar uma biblioteca. No entanto, para 33% dos brasileiros, nada os convenceria a entrar em uma.

Entre o passatempo preferido, ler livros, periódicos e textos na internet ocupa a sexta posição, com 28%. Na pesquisa anterior, o índice era de 36%.

Assistir à televisão segue na primeira posição, com 85% - em 2007, era a distração de 77% dos entrevistados.

Dos 197 escritores citados, os mais lembrados foram Monteiro Lobato, Machado de Assis, Paulo Coelho, Jorge Amado e Carlos Drummond de Andrade. Já os títulos mais mencionados foram a Bíblia, A Cabana, Ágape, O Sítio do Picapau Amarelo - que não é exatamente título de nenhum livro de Lobato - e O Pequeno Príncipe. Mas best-sellers como Crepúsculo, Harry Potter e O Monge e o Executivo também aparecem.

Maria Fernanda Rodrigues, O Estado de S. Paulo, 29-03-2012.

Câmara aprova Lei da Copa sem liberar bebidas alcoólicas


Apesar de não haver autorização expressa, texto também não proíbe, o que permite à Fifa negociar a venda de álcool. Projeto vai ao Senado; deputados definem que, nos jogos da seleção, 10% dos ingressos terão preços menores. Os deputados aprovaram ontem a Lei Geral da Copa sem a liberação explícita da venda de bebidas alcoólicas durante o Mundial e a Copa das Confederações.

A lei não liberou explicitamente o álcool, mas também não houve veto -duas emendas que previam a proibição foram rejeitadas.
O projeto segue para análise do Senado. Se a redação for mantida, a Fifa poderá ter que negociar diretamente com os 7 dos 12 Estados-sede da Copa que vedam o consumo em suas arenas.
Conforme a Folha revelou na semana passada, uma outra alternativa analisada pelo governo é a edição, a poucos dias do início da Copa, de uma medida provisória liberando a venda das bebidas.
A Lei Geral da Copa, que define regras para os eventos esportivos, foi um dos principais pontos de impasse na crise com os partidos aliados.
A crise se agravou na semana passada, quando o governo tentou votar a proposta, mas foi impedido por partidos da base, que exigiam a votação do Código Florestal.
A votação ontem foi possível porque o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), garantiu a análise da nova legislação ambiental em abril e porque o governo liberou verbas de emendas.
Os desencontros na Lei Geral da Copa tiveram início quando o governo decidiu, para agradar a bancada evangélica e facilitar a aprovação da lei, tirar a liberação explícita da venda das bebidas, proposta pelo relator, Vicente Cândido (PT-SP).
Um dia depois, ao constatar que havia assinado acordo com a Fifa garantindo que não imporia nenhuma restrição à venda de bebida, recuou e recolocou a liberação explícita no texto.
Em seguida, pressionado por aliados, voltou atrás novamente e resolveu apoiar o texto aprovado ontem, que apenas suspende, durante o evento, o artigo do Estatuto do Torcedor que proíbe a venda do álcool nos estádios durante as duas competições. Foi essa a versão aceita ontem. "O texto aprovado é o que foi possível dentro das polêmicas que geram esse tema", disse o relator.

MUDANÇAS

Ontem os deputados aprovaram proposta do DEM que diz que cada jogo da seleção brasileira nos eventos terá de ter ao menos 10% de ingressos mais baratos -estimados em pouco menos de R$ 50.
Segundo o projeto, a Fifa deve disponibilizar 300 mil ingressos desse tipo no Mundial e 50 mil durante a Copa das Confederações.
Cândido acatou ainda emenda que apenas prevê a possibilidade de a Fifa negociar a venda de ao menos 1% dos ingressos da Copa para pessoas com deficiência. Antes, o governo chegou a garantir que esse benefício seria obrigatório.

MARIA CLARA CABRAL
SIMONE IGLESIAS

quarta-feira, 28 de março de 2012

Tem preso saindo pelo ladrão

Dilema carcerário

 Como mostrou Claudia Antunes no último domingo, a taxa de encarceramento no Brasil praticamente triplicou nos últimos 16 anos. Passamos de 95 presos para cada 100 mil habitantes em 1995 para 269. Dos países mais populosos, perdemos para os EUA (730) e a Rússia (525).

Evidentemente, nossos 269 mal arranham o que seria a demanda total. Basta lembrar que nossa polícia ainda é de uma ineficiência atroz. Ela soluciona apenas 8% dos homicídios que investiga, contra taxas de 70% a 80% nos EUA e na Europa. Se fôssemos pôr na cadeia todos os que, pelas atuais regras, deveriam ter sua liberdade restringida, construir penitenciárias seria a principal atividade econômica do país.
É óbvio, entretanto, que não há muita racionalidade nesse sistema. Manter uma pessoa presa é extremamente caro para a sociedade e há cada vez mais dúvidas sobre a eficácia dessa medida em termos de redução da criminalidade.
Ninguém questiona o fato de que algo tem de ser feito contra quem viola regras. Tanto modelos da teoria dos jogos quanto evidências experimentais mostram que a cooperação entre grupos só se viabiliza se houver punições que inibam as ações dos "free-riders", isto é, de indivíduos dispostos a aproveitar-se do coletivo sem dar sua contribuição. Se desejamos sociedades estáveis, precisamos identificar os aproveitadores e puni-los. Sem isso, os grupamentos acabam entrando em colapso.
O problema é que estamos tão aferrados ao paradigma da restrição da liberdade que temos dificuldade para aceitar um regime mais econômico e lógico, no qual autores de crimes que não envolvam violência, como tráfico de drogas, fraude e lavagem de dinheiro, receberiam multas e penas alternativas.
O fato, porém, é que o atual sistema tem um limite. E ele fica menor à medida que a polícia se torna mais eficiente, como todos desejamos.

Hélio Schwartsman

terça-feira, 27 de março de 2012

Transparência e prestação de contas - a modernização do Judiciário brasileiro.


Duas faces da Justiça
Iniciativas modernizadoras, como as estatísticas abertas pelo Supremo, convivem com práticas atrasadas e privilégios extemporâneos
A celeuma que há alguns meses envolve o Judiciário resulta de uma tensão que mal começa a ser resolvida entre modernidade e atraso. De um lado, práticas que colocam a Justiça sob escrutínio público; de outro, reações de uma corporação ainda refém dos próprios defeitos.
A iniciativa do Supremo Tribunal Federal (STF) de divulgar dados estatísticos sobre processos é um exemplo de avanço. Com a medida, a Corte assume a linha de frente da implementação da Lei de Acesso a Informações Públicas, que entra em vigor em maio.
Ao adiantar-se à lei, o Supremo permite à sociedade acompanhar a eficiência de seus procedimentos. O cidadão interessado pode agora verificar quantos processos cada ministro tem em seu gabinete, por exemplo, e se estão parados.
Ferramentas como essa, além de representarem importante ganho de gestão, são um passo decisivo na direção da transparência e da prestação de contas, deveres a que estão submetidos todos os Poderes de uma República.
Aprofunda-se, assim, a modernização do Judiciário brasileiro, que começou de fato em 2004, quando a emenda constitucional nº 45 criou o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) como órgão de controle externo desse Poder.
Não é de estranhar, portanto, que o CNJ esteja no foco da controvérsia sobre o Judiciário. Responsável pela descoberta de desmandos por alguns magistrados -como os recentes privilégios em pagamentos de atrasados-, o órgão teve a atuação questionada por associações de juízes, mas o STF manteve seu poder de investigação.
Em vez de corroborar o esforço para reduzir a ineficiência e os abusos no Judiciário, porém, alguns magistrados preferem atacar não a existência de desvios, mas a sua revelação. Tampouco parece justificável insistir na manutenção de privilégios que, se um dia tiveram razão de ser, há muito já não têm.
É o caso do hábito de juízes trabalhistas não comparecerem ao fórum às sextas-feiras, revelado pelo programa "TV Folha" (transmitido aos domingos pela TV Cultura). Os magistrados, na hipótese mais condescendente, passam pelo fórum para pegar os processos e trabalhar em casa.
A resistência à modernização se manifesta até mesmo quando a novidade parece inofensiva, como a adoção de julgamentos por e-mail. A inovação foi introduzida no Tribunal de Justiça de São Paulo, mas, por enquanto, não prosperou.
Os membros do Poder Judiciário precisam dar-se conta de que, no Brasil de hoje, prerrogativas arcaicas não têm mais lugar. A pressão pela modernização da Justiça vai continuar.
Editoriais, Folha de São Paulo, 27/03/2012.

segunda-feira, 26 de março de 2012

Taxa de presos no Brasil quase triplica em 16 anos

Um em cada 262 adultos está na cadeia; São Paulo tem um terço dos detentos
Especialistas veem número desproporcional de prisões por droga e furto; custo e eficácia do sistema são questionados
CLAUDIA ANTUNES
DO RIO
Uma pessoa em cada grupo de 262 adultos está presa no Brasil. Em 1995, essa proporção era de 1 para 627. Em São Paulo, com um quinto da população brasileira e um terço dos presos, um em 171 está na cadeia.
Entre 1995 e junho de 2011, a taxa de encarceramento (número de presos para cada cem mil habitantes) brasileira quase triplicou. É a terceira maior entre os dez países mais populosos e põe em questão custos e benefícios de ter tantos presidiários.
A polêmica é semelhante à travada nos EUA, recordista em presos e onde a tese dominante de que só a prisão de todos os infratores habituais leva à redução de crimes é cada vez mais questionada.
O início da onda de encarceramento no Brasil foi uma reação ao aumento da violência urbana. A taxa de homicídios passou de menos de 15 por 100 mil pessoas em 1980 para quase 25 em 1990, chegando a 30 em 2003.
Hoje, estudiosos como Julita Lemgruber, do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Candido Mendes, e Pedro Abramovay, da FGV-RJ, apontam a contribuição desproporcional de acusados de tráfico para o crescimento da população carcerária. Segundo eles, é uma consequência da aplicação equivocada da Lei de Drogas de 2006. A lei livrou usuários de prisão e estabeleceu pena mínima de cinco anos para traficantes, sem direito à liberdade provisória.
O resultado foi oposto ao esperado, e "uma massa que fica na fronteira entre o tráfico e o uso" lota as cadeias, diz Abramovay. Os presos por tráfico quadruplicaram em seis anos, para 117 mil, 40% deles em São Paulo.
"A polícia tem recursos finitos, e os usa para prender pessoas não violentas que serão violentas quando saírem da prisão", afirma ele.
O ministro do Superior Tribunal de Justiça Gilson Dipp, presidente da comissão de reforma do Código Penal do Senado, diz que há uma combinação de "cultura da prisão" com deficiência das defensorias públicas estaduais.
Com um presidiário típico jovem e pobre, isso resulta em muitos detentos sem julgamento (cerca de 40%, contra 21% nos EUA) e acusados de furto, estes em número maior do que os que respondem por assassinato.
Em mutirão recém-realizado pelo Conselho Nacional de Justiça em 25 Estados, só a revisão administrativa de processos, sem mudar sentenças, beneficiou 72,6 mil presos -36,8 mil libertados. "Furto não é caso de prisão", diz Dipp, para quem só crimes "gravíssimos" ou violentos merecem cadeia

Sobrecarga de processos no Supremo Tribunal Federal

Tribunal se adianta à Lei de Acesso a Informações e passa a divulgar hoje dados como a data dos processos e em que fase eles estão
FELIPE SELIGMAN
LUCAS FERRAZ
DE BRASÍLIA
Existem hoje no STF (Supremo Tribunal Federal) cerca de 7.500 processos que há mais de dois anos ainda não tiveram nenhuma decisão.
Neste universo, que representa mais de 10% dos casos em tramitação, encontram-se ações ou recursos que aguardam um posicionamento da corte desde a década de 80.
O acúmulo de processos e a morosidade do Poder Judiciário são conhecidos. Mas, a partir de hoje, é possível qualificar a realidade do tribunal.
Por iniciativa do presidente do STF, Cezar Peluso, e aprovação de seus colegas, o Supremo decidiu se adiantar à Lei de Acesso a Informações, que entra em vigor em maio, e passa a divulgar dados estatísticos sobre os processos que tramitam na corte.
Pela primeira vez, o STF publicará quantidade de processos no gabinete de cada ministro, quantos aguardam parecer da Procuradoria-Geral da República ou a data em que foram protocolados. As informações estarão disponíveis em www.stf.jus.br.
"Isso facilitará o trabalho de gestão do tribunal. É possível saber, por exemplo, quantos processos o Supremo deve julgar para zerar a quantidade de casos que chegaram antes de 1990", diz Maria Cristina Petcov, secretária-geral da presidência.
A Folha teve acesso a todas essas informações, que serão atualizadas diariamente. Cerca de 63 mil casos estavam tramitando no Supremo até a última quinta-feira.
Apenas 28% deles são ações iniciadas diretamente no STF por serem de competência exclusiva do tribunal. O restante chegou de instâncias inferiores. Deste total, quase 40% constam como "sem nenhuma decisão", mas a maioria deu entrada na corte nos últimos dois anos.
No mês passado, a Folha publicou o caderno "A Engrenagem da Impunidade", revelando que uma série de erros e omissões de magistrados, procuradores e policiais federais é o motivo pelo qual nunca chegam ao fim os processos criminais contra políticos brasileiros.
Desde então, o jornal divulga a íntegra desses inquéritos ou ações penais, iniciativa que faz parte do projeto "Folha Transparência".
No caso do STF, as informações são estatísticas e dizem respeito a todo o tipo de processo, não só os criminais.
Os dados mostram, por exemplo, que mais de 4.000 processos aguardam a análise do procurador-geral da República para que possam ter andamento no tribunal.
MINISTROS
Essa sobrecarga acontece até mesmo quando os ministros anunciam que estão prontos para os julgamentos.
Em outubro de 2000, o ministro Marco Aurélio Mello avisou que um recurso vindo de São Paulo poderia ser levado ao plenário. Até hoje isso não aconteceu.
Esse e outros 658 casos estão liberados para ser incluídos na pauta, mas aguardam na fila de julgamentos.
As informações também revelam que o ministro com o maior acervo de processos é Marco Aurélio, com 9.003 casos. Ele, no entanto, é um dos únicos que não aceita convocar juízes auxiliares para o ajudar na análise dos casos.
Em seguida estão José Antonio Dias Toffoli (8.523) e Joaquim Barbosa (8.247). Já os ministros com menos processos em seus gabinetes são Ricardo Lewandowski, com 2.882, e Carmen Lúcia, que tem um acervo de 2.872

sábado, 24 de março de 2012

Ponto eletrônico muda e amplia o custo de empresas


CLAUDIA ROLLI
DE SÃO PAULO
Após cinco adiamentos, deve entrar em vigor em 2 de abril o novo sistema de registro de ponto eletrônico.
Ao menos 400 mil empresas do país, de vários setores, terão de implementar novos equipamentos que permitem a impressão de comprovantes de entrada, saída e intervalos no trabalho.
São obrigadas a instalá-lo todas as empresas que já usam o ponto eletrônico e têm mais de dez empregados, como prevê a portaria 1.510 do Ministério do Trabalho, editada em agosto de 2009.
A justificativa do governo federal para a adoção do novo sistema é evitar fraudes na marcação da jornada.
Pesquisa nos dois dos maiores tribunais do Trabalho do país -São Paulo e Rio Grande do Sul- por dez anos mostrou que o percentual de processos trabalhistas com fraudes na marcação é mínimo -está abaixo de 1%.
Os dados serão publicados em breve pelos coordenadores do estudo, os professores Hélio Zylberstajn, da USP, e Luciana Yeung, do Insper.
"Mais burocracia, custos e mais transtornos para todos. Em nenhum país existe tal obrigatoriedade", diz Adauto Duarte, diretor-adjunto da área sindical da Fiesp.
Para Oswaldo Oliveira Filho, diretor da área de confecção da Rosset e da Abit, entidade que representa 30 mil indústrias têxteis e de confecção do país, as empresas perdem produtividade.
"Na confecção, a produção é cronometrada. Imagine perder tempo para que cada empregado imprima seu comprovante", afirma.
No setor, 95% da mão de obra é feminina e a medida pode ter impacto social, segundo Oliveira: "A funcionária não vai mais poder levar seu filho na creche e entrar fora do horário de turno?".
No comércio, os empresários estão preocupados. Empresas como Casas Bahia, que com o Ponto Frio emprega 67 mil pessoas, terão de imprimir 268 mil comprovantes por dia -considerando entrada, intervalo (almoço e retorno) e saída do trabalho.
Fernando Henrique Berg de Abreu, sócio da FHB, distribuidora de material elétrico, adotou e aprovou o novo sistema, mas acredita que o governo poderia subsidiar a compra do equipamento.
Para o setor financeiro, um dos maiores entraves é que as empresas usam sistemas integrados de marcação de ponto com folha de pagamento e setor de recursos humanos.
"Foram gastos milhões com softwares desenvolvidos para cada empresa. E agora? Devem desembolsar mais milhões para readaptarem seus sistemas ou jogam tudo no lixo porque o novo aparelho não permite acesso externo, apenas da fiscalização?", diz Magnus Apostolico, superintendente de relações trabalhistas da Febraban, a federação do bancos

sexta-feira, 23 de março de 2012

Será que precisávamos criminalizar tanto?

O editorial da Folha de 18 de março apresenta com lucidez e correção a necessidade de se restabelecer a proporcionalidade entre penas, crimes e valores mais caros à sociedade. O direito, como fenômeno histórico e social, jamais pode ser divorciado dos anseios da sociedade.
No contexto da política criminal do país, várias questões preocupam.
Uma é o elevado número de subnotificações -somente um quarto dos crimes são formalmente registrados. Existe ainda uma crise das demais formas de controle social, colocando o direito penal como única instância para solução dos conflitos sociais.
Há ainda incapacidade do Estado em executar políticas públicas suficientes e a necessidade de tutela de novos bens difusos trazidos com a Constituição de 1988 -como o meio ambiente, a ordem tributária, a segurança viária e a saúde pública.
O Estado é incapaz de fiscalizar e executar adequadamente o sistema penitenciário e a política legislativa de adoção de penas restritivas de direitos seja para crimes médios, seja para crimes de alta periculosidade.
Isso ocorre, entre outros fatores, porque crimes de pequeno e médio potencial ofensivos são assim classificados pelas penas abstratamente contempladas e não pelo valor do bem que protegem.
Desde 1988, foram formatados quase 700 novos crimes, sendo certo que somente um quarto destas infrações se sujeita, na prática, à pena privativa de liberdade.
Será que precisávamos criminalizar tanto? Não seria o caso de uma adequada ponderação de interesses para garantir às infrações mais graves a aplicação efetiva da pena privativa de liberdade?
É evidente que o sistema de penas deve ser construído de modo a obedecer ao escalonamento de valores historicamente construídos pela sociedade, visando a proporcionalidade entre o crime e a pena.
Mas é imperioso constatar que o direito penal cumpre uma função ética e social, protegendo valores fundamentais para a subsistência da vida em sociedade.
Na medida em que o Estado se torna omisso ou mesmo injusto, dando tratamento díspar a situações assemelhadas, acaba por incutir na consciência coletiva a pouca importância que dedica aos valores que pretende tutelar.
Em vez de se legitimar socialmente, o direito penal como hoje é concebido afeta a crença na justiça penal. Ele propicia que a sociedade deixe de respeitar tais valores, gerando um círculo vicioso. Em pouco tempo, a desilusão com a incerteza de um direito justo gera clamores por uma nova lei penal.
É preciso coerência e congruência normativa -além do domínio da dogmática e da técnica legislativa em geral, a lei deve ser funcional, fragmentária, mas eficiente no que se propõe a tutelar.
Para tanto, é preciso é preciso denunciar a falácia de que o criminoso é vítima da sociedade e reconhecer que as propostas de mudanças legislativas em matéria criminal não podem se distanciar dos interesses de um direito penal da sociedade.
Somente assim cumprimos o papel e objetivo fundamental de nossa República: "construir uma sociedade livre, justa e solidária".
Estamos trabalhando com esse intuito e precisamos levantar uma bandeira: a recodificação da legislação penal. Somente com a sistematização da legislação penal será possível expor as incongruências das penas, a desnecessidade de vários crimes e proteger suficientemente a sociedade.
FERNANDO GRELLA VIEIRA, 55, é procurador-geral de Justiça do Estado de São Paulo
ALEXANDRE ROCHA ALMEIDA DE MORAES, 38, é promotor de Justiça

quinta-feira, 22 de março de 2012

Composição do Supremo Tribunal Federal

Leis e normas sobre venda de bebidas nos estádios.

Bebida na Copa será liberada, diz ministro
Para Aldo Rebelo (Esporte), não é preciso aval explícito na lei federal para que álcool nas arenas seja permitido
Apesar disso, 3 dos 12 Estados-sede admitem, caso necessário, mudar leis e normas que vedam a bebida nos estádios O ministro Aldo Rebelo (Esporte) disse ontem que, na avaliação do governo, não será necessário à Fifa negociar com os Estados a venda de álcool nas arenas, mesmo que a Lei Geral da Copa não traga a liberação expressa, como definiu anteontem o governo.
Para o ministro, a última versão do texto em tramitação na Câmara -sem a liberação explícita, mas com a retirada da proibição que está no Estatuto do Torcedor- prevalece em relação às leis estaduais que vedam a venda de álcool nos estádios.
A interpretação diverge da de deputados do próprio governo, que reafirmaram ontem haver a necessidade de a Fifa negociar com Estados.
Dos 12 que receberão jogos da Copa do Mundo em 2014, três -Rio Grande do Sul, Pernambuco e Ceará- já admitem, caso necessário, mudar legislação e normas que proíbem o consumo.
Tarso Genro (PT) encaminharia ao Legislativo projeto para alterar lei atual.
O governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), informou via assessoria que apesar de ser contrário às bebida nos estádios trabalhará pela flexibilização da lei exclusivamente para o período da Copa.
Anteontem, o governador do Ceará, Cid Gomes (PSB), declarou que também tentará mudar a regra.
As outras nove sedes (SP, RJ, MG, PR, MT, BA, PE, AM e RN) aguardam definição do Congresso para se pronunciar.
A discussão foi retomada após uma sucessão de promessas e recuos do governo federal. Temendo derrota no Congresso, o Planalto optou por não inserir artigo liberando explicitamente a bebida. Ele apenas retomou a proposta de suspender durante as duas competições artigo do Estatuto do Torcedor que proíbe a venda.
Dessa forma, há um entendimento de que a Fifa terá que negociar com os Estados.
O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, classificou a atitude federal como "omissão" e voltou a defender uma regra única.
"Tendo em vista essa omissão federal, São Paulo vai tomar uma posição", disse.
Texto Jornal Folha de São Paulo, 22/03/2012. 

segunda-feira, 19 de março de 2012

Reforma da Legislação Penal

Urge reformar a legislação criminal brasileira para restabelecer o princípio de proporcionalidade entre penas, crimes e valores
O Senado e a Câmara discutem atualmente, em comissões separadas, alterações profundas na legislação penal brasileira.
Na Câmara, debate-se uma reforma voltada a valorizar penas alternativas e a punir crimes violentos e corrupção. A direção está correta, mas, ao pôr de lado temas como aborto ou eutanásia, a comissão reforça a tendência preocupante de parlamentares a se omitirem em temas polêmicos.
No Senado, o autor do requerimento de criação da outra comissão, senador Pedro Taques (PDT-MT), afirma que o código atual, com 72 anos, já merece aposentadoria compulsória. A idade avançada não é o problema mais grave do diploma legal, e sim a colcha de retalhos em que se transformou.
Entre reformas expressivas -como a de 1984- e mudanças pontuais, 53 leis modificaram o Código Penal desde 1940. Mais de dois terços das alterações aconteceram depois da Constituição de 1988.
Foram promulgadas, ainda, diversas leis que criam crimes e estabelecem penas, mas sem alterar o código propriamente dito. Tudo somado, obtém-se um emaranhado obscuro de normas.
Um Código Penal sem coerência e clareza representa grave deficiência para a democracia. O direito criminal configura a possibilidade mais severa de interferência na vida do cidadão. Ali estão previstas as condutas que, praticadas, autorizam o Estado a privar a pessoa de sua liberdade.
O Código Penal existe para regrar essa interferência extrema e impedir que fique submetida apenas ao arbítrio dos agentes do Estado. Deve expressar a hierarquia de valores da sociedade e espelhar-se, sempre, na Constituição, fundamento do pacto político da nação.
Esse é o cerne do princípio da proporcionalidade. Uma conduta que atente contra um valor mais importante deve ensejar uma pena maior; um comportamento que afete valores menos expressivos deve resultar em penas mais baixas; e uma prática que não prejudique valor relevante para a sociedade não deve ser criminalizada.
A verdadeira barafunda jurídica em que se converteu a legislação penal claramente desrespeita o princípio da proporcionalidade.
A vida e a liberdade são os bens mais preciosos para o ser humano. Crimes como os de sequestro ou cárcere privado (pena de 1 a 3 anos de prisão) e homicídio (6 a 20 anos) deveriam figurar no ápice da hierarquia penal. Mas o código reserva penas exorbitantes a alguns crimes banais, como soltar balões (1 a 3 anos) ou molestar cetáceos de modo intencional (1 a 5 anos).
Outra falha de proporção ocorre com crimes tipificados em momentos de grande comoção popular, seguida de cenas explícitas de debate parlamentar oportunista.
Daí resultam situações esdrúxulas, como é o caso da falsificação de produto terapêutico. O delito foi codificado no calor de denúncias de adulteração de pílulas anticoncepcionais e contemplado com uma pena de 10 a 15 anos de prisão -que poderia ser aplicada até a quem falsificar um xampu anticaspa, por exemplo.
A onda de sequestros-relâmpago fez com que o Congresso aprovasse uma lei que atribui à lesão corporal durante um sequestro desse tipo pena maior que a de homicídio: 16 a 24 anos.
Certos crimes, por não serem praticados com violência, poderiam ter um tratamento menos severo, como o furto qualificado (pena hoje de até oito anos de prisão).
Caberia discutir a inclusão nessa categoria até da venda de pequena quantidade de drogas, que hoje não pode receber pena alternativa, só a de privação de liberdade.
Por outro lado, crimes que, mesmo cometidos por uma só pessoa, produzem danos profundos a toda a sociedade, recebem punições aquém do que parece razoável.
Abuso de poder e prevaricação têm pena prevista de três meses a um ano; submeter alguém a trabalho escravo, corrupção, peculato e tráfico de influência, pena mínima de dois anos; lavagem de dinheiro, três anos. E, diferentemente de países que já preveem penas altas para quem participa de organizações criminosas estruturadas (3 a 6 anos na Itália), o Brasil ainda usa a antiquada figura da quadrilha, com pena de 1 a 3 anos.
A desproporcionalidade generalizada compõe um direito penal desconectado dos valores constitucionais e produz uma situação desconcertante. Embora os cárceres estejam apinhados, e os governos admitam que não têm como criar vagas para tanta gente, o sentimento de impunidade que revolta a população só faz crescer.
Um Código Penal reformado à luz do princípio de proporcionalidade entres os delitos criaria uma base sólida para tornar a política criminal mais eficiente. As prisões não ficariam superlotadas com criminosos de pequena periculosidade e se destinariam àqueles que realmente violaram os valores mais preciosos da sociedade.
Editoriais
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EUTANÁSIA

Aparentemente ninguém deu muita bola para a proposta, feita pela comissão de juristas que revê o Código Penal, de descriminalizar certos tipos de eutanásia. Esse, entretanto, é um assunto importantíssimo e que tende a ficar cada vez mais premente, à medida que a população envelhece e a medicina amplia seu arsenal terapêutico.
Desligar as máquinas que mantêm um paciente vivo pode ser descrito como um caso de homicídio, ainda que com o objetivo nobre de evitar sofrimento, ou como uma recusa em prosseguir com tratamento fútil, o que é perfeitamente legal.
Como sempre, acho que cabe a cada qual fazer suas próprias escolhas. Mas, já que nem sempre sabemos o que é melhor, convém dar uma espiadela em como pensam aqueles que, de fato, entendem do assunto.
Num artigo que está movimentando a blogosfera sanitária e já foi reproduzido no "Wall Street Journal" e no "Guardian", o doutor Ken Murray sustenta que, embora os médicos apliquem todo tipo de manobra heroica para prolongar a vida de seus pacientes, quando se trata de suas próprias vidas e das de seus entes queridos, eles são bem mais comedidos.
Como estão familiarizados com o sofrimento e os desfechos das medidas extremas, querem estar seguros de que, quando a sua hora vier, ninguém vai tentar reanimá-los nem levá-los a uma UTI para entubá-los e espetá-los com cateteres. Murray diz que um de seus colegas chegou a tatuar o termo "no code" (sem ressuscitação) no próprio corpo.
A pergunta que fica, então, é: se não são sádicos, por que os médicos fazem aos outros o que não desejam para si mesmos. E a resposta de Murray é que ocorre uma perversa combinação de variáveis emocionais, econômicas, mal-entendidos linguísticos, além, é claro, da própria lógica do sistema. Em geral, para o médico é muito mais fácil e seguro apostar no tratamento, mesmo que ele se estenda para muito além do razoável.

sexta-feira, 16 de março de 2012

Energia nuclear: desnecessária e perigosa.

Os alemães vão acabar com as suas usinas, mas apoiam Angra 3; queremos fazer um plebiscito sobre o tema e levar autoridades para conhecer Chernobyl
Um ano após a tragédia em Fukushima, após 25 anos de Chernobyl e após 24 anos do Césio-137 em Goiânia, a humanidade deve se perguntar: os custos, o perigo e o resíduo gerados pela energia nuclear são justificáveis?
Não, sobretudo no Brasil, nação que dispõe de uma ampla gama de opções energéticas limpas, como a eólica, a solar, a maremotriz etc. A energia eólica, por exemplo, é extremamente subutilizada, representando menos de 1% da matriz energética nacional.
A busca pela construção de Angra 3 é a demonstração de que o governo brasileiro não está tão comprometido com a produção de energias renováveis mais seguras.
O projeto Angra 3 é um dos resquícios dos métodos utilizados pelos militares durante o programa nuclear brasileiro, visto que os custos de Angra 1 e 2 ainda são desconhecidos. Na usina em construção, sabe-se apenas o valor estimado, em torno de R$ 10,8 bilhões.
Também já é ponto pacífico na comunidade cientifica que a energia produzida nas usinas é imensamente mais cara que a de outras fontes, um prejuízo ao consumidor.
Ademais, os conhecidos problemas de Angra 1 e 2 não foram suficientes para demover o governo da busca nuclear. São eles: a falta de uma rota de fuga para a população; a inadequação aos padrões internacionais de segurança; as dificuldades e o risco no armazenamento do lixo nuclear; e a ameaça a todo o eixo Rio-São Paulo.
Muitas nações já vêm buscando dar um fim aos seus projetos nucleares, prevendo desmantelar as suas usinas nas próximas décadas.
A Alemanha se tornou célebre por anunciar essa decisão logo após Fukushima. Entretanto, contraditoriamente, o país financia e dá lastro para o desenvolvimento de usinas no exterior, como Angra 3.
Isso vem sendo feito por meio da garantia Hermes, uma espécie de seguro dado pela empresa de fomento Euler Hermes -e que talvez seja suspenso pelo parlamento alemão.
O Brasil possui apenas uma pequena parcela de toda sua matriz energética proveniente das duas usinas fluminenses. Uma guinada em direção a outras fontes não seria algo traumático.
Para levar a questão a todos os cidadãos, apresentei o projeto de decreto legislativo 225/2011, que estabelece um plebiscito concomitante com a próxima eleição, questionando aos brasileiros a conveniência do uso da energia nuclear.
O governo deseja a célere rejeição do projeto, de tal forma que o relator do projeto na Comissão de Meio Ambiente manifestou que cabe apenas aos congressistas decidirem sobre questões nucleares e que a manifestação popular não é cabível. Uma interpretação equivocada e claramente adversa aos ideais democráticos.
Por fim, uma comitiva vem sendo organizada para levar autoridades a Chernobyl neste ano. É uma oportunidade de dar mais luz ao perigo a que estamos expostos.
Ricardo Izar

Lei Geral da Copa: um equívoco político e jurídico

“A Lei Geral da Copa, ao constituir, entre outras coisas, direitos de patente e de exclusividade comercial à Fifa, viabiliza a reserva, o monopólio de mercados que, juntos, representam parte significativa de seus lucros”, constatam os entrevistados, Guilherme Varella e Thiago Hoshino .
"As redes sociais têm sido o palco das reivindicações de torcedores, movimentos sociais e sociedade civil contra o Projeto de Lei PL 2330/11, que dispõe sobre as medidas relativas à Copa das Confederações Fifa de 2013 e à Copa do Mundo Fifa de 2014, que serão realizadas no Brasil. “As redes sociais cumprem um papel importante de pressão pública e vocalização de demandas da sociedade, fazendo que com que as mensagens necessariamente cheguem a quem tem que chegar. Não há como as autoridades ignorarem o poder das redes na internet e tomarem decisões alheias ao que nelas circula. O tuitaço ajudou tremendamente a pautar as nossas reivindicações na imprensa. Além do mais, quando um tópico chega aos Trending Topics, ele será imediatamente visto por centenas de milhares de usuários do Twitter que foram expostos à campanha e entraram na página para enviar mensagens aos deputados”, avaliam Guilherme Varella e Thiago Hoshino. Segundo eles, a internet está sendo usada como um instrumento para forçar a transparência das negociações e, em função das pressões via redes sociais, vários pontos do PL 2330/11 já foram alterados.
Sobre essa “legislação de exceção”, como um todo, a intenção dos Comitês Populares da Copa é consolidar um levantamento extenso e analítico de todo esse bloco de medidas, demonstrando e denunciando a engenharia jurídica por trás dos megaeventos."

Por Graziela Wolfart e Patricia Fachin

 

quarta-feira, 14 de março de 2012

Energia nuclear solução? A insegurança das usinas nucleares.



O poder da metáfora na proposta do novo Código Penal.

A comissão de juristas encarregada pelo Senado de propor um novo Código Penal sugere que o aborto legal possa ser praticado até a 12ª semana de gravidez quando, a partir de um pedido da gestante, o "médico ou psicólogo constatar que a mulher não apresenta condições de arcar com a maternidade". Parece-me pouco provável que a iniciativa prospere, mas é uma tentativa interessante.
O que a comissão pretende ao associar o aborto à ideia de saúde da mulher é retirá-lo da categoria mental de assassinato, onde foi colocado por um eficiente discurso conservador, para apresentá-lo como uma questão sanitária.
Há ciência por trás dessa investida. Pesquisadores como o linguista George Lakoff sustentam que o cérebro não toma decisões analisando prós e contras de uma questão abstrata que lhe seja apresentada, mas se deixa conduzir por narrativas, mais especificamente por "frames" (enquadramentos) e metáforas.
Para Lakoff, metáforas são mais que um recurso linguístico para explicar ideias. Elas são a própria matéria-prima do pensamento e têm existência física no cérebro. A capacidade dos neurônios de conectar-se em redes ativadas por contiguidade semântica faz com que as palavras escolhidas tenham o dom de comunicar sentimentos. O uso de um termo negativo como "assassinato" desperta sensações desagradáveis que, mesmo que não nos demos conta, influenciam nossos posicionamentos.
Nesse esquema, o que diplomatas fazem é encontrar novos e mais palatáveis "frames" para embalar antigas disputas. Às vezes, funciona.
A metáfora da saúde, embora tenha perdido terreno no debate aqui, é poderosa. Foi ela que levou a Arábia Saudita, a mais rígida teocracia do planeta, a ter uma legislação de aborto mais liberal que a brasileira, ao admitir, ao menos no papel, que mulheres interrompam a gravidez para preservar sua saúde física ou mental.

terça-feira, 13 de março de 2012

Ministros do Supremo decidem sobre a criação do Instituto Chico Mendes.

Leis e essências

Para que servem as regras? Tomemos um caso concreto. Na quarta-feira passada, os ministros do Supremo decidiram que a criação do Instituto Chico Mendes, em 2007, tinha um vício de origem (foi aprovado por medida provisória que não passou por todas as comissões necessárias), sendo, portanto, inconstitucional e inválida.
Na quinta-feira, quando os indômitos magistrados se deram conta de que idêntico raciocínio aplicava-se a centenas de leis originadas a partir de MPs, que também correriam risco de ser declaradas nulas, mudaram o alcance da decisão, afirmando que ela só vale para casos futuros.
Do jeito que fez, o STF deu a impressão de que trata os assuntos que lhe são submetidos com uma certa leviandade, mas é difícil sustentar que os ministros poderiam ter agido de outra forma. A instabilidade jurídica que se seguiria seria excessiva até para os padrões brasileiros.
As MPs são fichinha perto de um outro caso já quase esquecido. Em 2003, o ex-parlamentar e ex-ministro do STF e de várias pastas em diversos governos, Nelson Jobim, em uma de suas inconfidências, revelou que a Comissão de Redação da Constituinte introduziu na Carta de 1988, com o aval de lideranças partidárias, dispositivos que não haviam sido aprovados em dois turnos no plenário, como mandava o figurino.
É um belo de um vício de origem, uma fraude até. Mas teria sido inconsequente anular no todo ou em parte a Constituição por causa da esperteza dos caciques políticos de então.
É claro que não podemos desprezar ritos e regras de procedimento, que, em geral, existem por boas razões, mas não faz sentido tentar corrigir erros do passado abraçando fardos desproporcionais. Leis, em especial as que regem o funcionamento da sociedade, não existem para expressar essências mágicas das instituições, mas para facilitar as nossas vidas. Acreditar demais em essências é a marca do pensamento conservador.

segunda-feira, 12 de março de 2012

Poder da indústria farmacêutica e o exercício da medicina.

Médico não é garoto-propaganda

É cruel e macula a classe viajar à custa de laboratórios, sonegar impostos ('com recibo ou sem?'), cobrar 'por fora' do convênio e ganhar percentual por próteses
O novo Código de Ética Médica, em vigor desde abril de 2010, foi unanimemente saudado como um documento atual, abordando temas polêmicos com coragem e lucidez.
Foi, portanto, com tristeza e decepção que a sociedade brasileira tomou conhecimento de uma emenda a um ponto importante do código, sobre a relação dos médicos com os laboratórios farmacêuticos.
No artigo 69 do código de 2010, foi vedado ao médico "obter vantagem pelo encaminhamento de procedimentos, pela comercialização de medicamentos, órteses e próteses ou implantes, cuja compra decorra de influência direta em virtude de sua atividade profissional". A intenção era coibir essa relação indigna que denigre a categoria médica.
Na emenda divulgada na semana passada, o Conselho Federal de Medicina corrigiu a norma, sob a alegação lamentável de que não conseguiu conter a pressão dos laboratórios e de determinado segmento de médicos.
Agora, permanece a velha relação indigna entre médicos e laboratórios, tornando alguns profissionais -felizmente a minoria- garotos-propaganda comerciais.
Sou radicalmente contra essa prática, pelos seguintes motivos:
1) Os médicos são profissionais que têm, em geral, uma remuneração digna e suficiente para manter uma vida de boa qualidade.
Não precisam desses subterfúgios de ética duvidosa e às vezes ilegais: viajar às custas de laboratórios, sonegar imposto de renda em conluio constrangedor com os pacientes ("com recibo ou sem recibo?"), cobrar "por fora" em convênios de planos de saúde, receber percentual para colocar próteses indicadas especificamente, entre outros. Tais práticas maculam a categoria.
2) Afirmar, como foi feito na argumentação para a referida emenda, que os médicos não direcionam suas prescrições em função da prática de receber viagens gratuitas é de uma ingenuidade e de uma desfaçatez inaceitáveis.
Além de pesquisas já feitas em outros países que demonstram que ocorre efetivamente esse receituário dirigido, é uma dedução óbvia: os laboratórios visam, com essa prática, a fidelidade comercial.
3) O dado mais importante é que, no final das contas, quem vai pagar as viagens dos médicos são os pacientes, em situação de sofrimento físico e psíquico, muitas vezes incapacitados e frequentemente hipossuficientes. É uma crueldade inominável, pois o custo das viagens obviamente será repassado para o preço dos medicamentos.
É aceitável que sejam financiadas viagens relacionadas a pesquisas dos laboratórios feitas por médicos, necessárias à própria pesquisa ou destinadas a relatar em eventos médicos os resultados obtidos. É importante, entretanto, fazer ainda as ressalvas nesses casos, destinadas a evitar a simples propaganda de um produto comercial específico.
O Conselho Federal de Medicina deveria rever a emenda anunciada agora, retornando ao texto original do código de 2010. Se houver polêmica, sugiro realizar uma pesquisa de opinião entre os médicos brasileiros, que certamente irão apontar para a decisão de manter a categoria fora do conflito de interesses e reafirmar a dignidade profissional.

domingo, 11 de março de 2012

Constituição provisória


BRASÍLIA - O Supremo Tribunal Federal cometeu uma de suas maiores lambanças nesta semana. Na quarta-feira, pronunciou inconstitucional a forma como foi aprovada a medida provisória que havia criado o ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade). No dia seguinte, revogou sua decisão por clara pressão política e por vislumbrar consequências devastadoras na estrutura jurídica do país.
Não é novidade nem é proibido o STF mudar de opinião. Às vezes é até bom, e alguns ministros usam um eufemismo ao votar de maneira diferente. "Eu não mudei. Evolui", já me disse um deles. Mas chamou a atenção agora a velocidade com que a decisão foi reformada.
Para resumir, na quarta-feira o STF achou que o Congresso desrespeitou a Constituição ao não submeter as medidas provisórias a uma comissão mista de senadores e deputados. A regra existe desde 2001. Por consequência do julgamento, a MP do Instituto Chico Mendes tornou-se inconstitucional.
No dia seguinte, notou-se o óbvio: se a MP do Instituto Chico Mendes foi aprovada de forma inconstitucional, todas as outras cerca de 500 MPs editadas desde 2001 também passariam a ser irregulares. Ou seja, o Brasil em breve seria alvo de um tsunami de ações judiciais contestando leis vigentes.
Aí o STF enveredou por um caminho perigoso. Declarou ser constitucional o que foi, de fato, inconstitucional de 2001 para cá. O recuo se deu, em tese, para evitar instabilidade jurídica. Só que os magistrados determinaram também que, daqui para a frente, o Congresso deverá mudar seu ritual e votar MPs de acordo com a Carta Magna.
Tudo somado, o Supremo inaugurou uma nova era no Brasil. De 2001 até esta semana, o país teve uma espécie de "Constituição provisória". Valia pela metade. Agora, será para valer. Alguém acredita?

sexta-feira, 2 de março de 2012

Legalidade e o Ministro do STF Joaquim Barbosa


Ministros do STF discutem durante sessão

O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Joaquim Barbosa chamou de "absurda" uma decisão tomada pelo colega José Antonio Dias Toffoli, que arquivou, por iniciativa própria, um inquérito contra o deputado federal Pedro Henry (PP-MT).
A pedido da Procuradoria-Geral da República, a corte decidiu reverter a decisão e deu sequência ao inquérito.
Henry é investigado por usar um cargo de comissão da Câmara para pagar o piloto de seu avião particular. A Procuradoria quer verificar se houve uso do bem público para fins particulares.
Em meio a pedidos de investigação, Toffoli decidiu, por sua iniciativa, arquivar o caso. Barbosa, então, pediu a palavra e afirmou que o arquivamento foi "absurdo".
Toffoli rebateu e disse que o regimento permite o procedimento. Barbosa não se contentou com a explicação: "Insisto na ilegalidade. Conceder esse poder individual em um órgão colegiado dá nisso. Abuso".
Saúde pública do Brasil passa raspando em sua própria avaliação
A falta de acesso a serviços especializados no sistema público de saúde não chega a ser uma novidade. Mas com os resultados revelados no Índice de Desempenho do SUS é possível chegar mais perto do tamanho do problema e se impressionar com ele.
Quando se buscam os índices de acesso a serviços de média e alta complexidade nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, o que aparece no mapa é uma imensa área vermelha. Isso se traduz em cidades com os piores serviços com notas inferiores a 3,9.
Embora o novo índice não mensure filas de espera nem as distâncias percorridas até se conseguir atendimento, outras fontes já retrataram parte dessas dificuldades.
Em 2011, relatório do Tribunal de Contas da União expôs o problema na área oncológica, uma das mais críticas. Em 2010, só 34% dos pacientes de câncer conseguiram fazer radioterapia. Outros 53% demoraram muito para conseguir uma cirurgia.
O tempo médio de espera por uma quimioterapia foi de 76 dias. Apenas 35% dos pacientes foram atendidos em 30 dias (prazo recomendado pelo Ministério da Saúde). Na radioterapia, são 113 dias de espera, em média. Apenas 16% são atendidos no primeiro mês.
Isso sem contar o tempo precioso perdido entre o cidadão perceber que tem algo errado, conseguir consulta com especialista e encontrar vaga em centro oncológico.
Os números do IDSUS mostram que só 1,9% da população brasileira vive nos municípios cujos serviços públicos de saúde têm notas acima de 7.
Embora o governo federal evite estipular meta, o fato é que, com uma média de 5,4, a saúde do país quase ficou em recuperação em sua própria avaliação. E precisa fazer mais o dever de casa para não passar raspando nas próximas provas.